quinta-feira, 13 de junho de 2013

PAULO GONÇALVES DOS SANTOS -(PAULO VIRGÍNIO) - MÁRTIR E HERÓI CUNHENSE



 

         O primeiro levantamento da vida e morte de Paulo Virgínio foi realizado pelo senhor José Arantes, distinto oficial do cartório de Registros de Imóveis e Anexos de Cunha, que no papel de escrivão de juiz teve em suas mãos cópia da denúncia, oferecida pelo Dr. Promotor Público da 2ª. Auditoria da primeira Circunscrição Militar da Capital Federal, cópia do depoimento das testemunhas inquiridas no inquérito aberto no local do dia do fuzilamento de Paulo Virgínio, e cópia do relatório da autoridade que processou o inquérito.

         De posse desses importantes documentos, pôde o Sr. José Arantes atender à solicitação do Sr. J. A. César Salgado, diretor do departamento da cultura cívica do clube Piratininga, de São Paulo, segundo carta endereçada a ele em 20/07/1935.

         Pretendia, portanto, o referido clube, comemorar em agosto daquele ano a vitória de Cunha sobre as forças da ditadura e nessa comemoração não poderia ser esquecido o nome de Paulo Virgínio.

         Para tanto enviou-lhe um questionário sobre a vida e circunstância da morte de Paulo Virgínio, o qual utilizou num boletim sobre o Herói Cunhense, com clichê da viúva e dos três filhos, em 20/08/1935.

         Paulo Gonçalves dos Santos era seu verdadeiro nome, nascido e criado no bairro do Taboão em Cunha, possivelmente em 26 de setembro de 1897 ( baseando-se em seu batistério) tendo em vista ter sido arrancada pela ditadura a folha do livro de registro, relativa ao seu nome. Seu pai chamava-se Virgínio Gonçalves dos Santos e a mãe Dª. Maria José de Jesus, daí a razão de seu apelido Paulo Virgínio ( filho de...) modo muito peculiar de se denominar os filhos no interior deste Estado.

         Lavrador humilde e batalhador, vivia com a família – a esposa, Juventina Maria de Jesus e os quatro filhos menores – José, Virgílio, Julia e Clotilde ( que faleceu durante a revolução), no bairro do Taboão, distante da cidade de Cunha, aproximadamente quinze quilômetros, longe das tribulações de um centro urbano, junto ao aconchego do universo familiar.   

         A partir de 10 de julho de 1932, os bairros Rio Abaixo, Aparição, Campo Alegre, Taboão e Mato Limpo, passam a ser “zona inimiga” e em termos um “outro país”, porque aí se aquartelavam os soldados legalistas ou ditatoriais. Os tropeiros e as demais pessoas desses bairros necessitavam de salvo-condutos para circular pelas redondezas, e assim algumas tropas foram requisitadas pelos ditos soldados para supri-los de munição e víveres, buscando-os em Paraty.

         Além disso, muitos homens desses bairros eram obrigados a trabalhar, também, a soldo de comida, deixando os familiares escondidos no mato, à deriva.

         Tudo corria relativamente normal nesses bairros, embora  muitas famílias, temerosas de males piores, abandonassem as fazendas, sítios e casas, deixando-os à deriva, para alegria dos soldados que se fartavam do gado, animais de carga e de sela, porcos e víveres.

         Além dos tropeiros, os ditatoriais precisavam de batedores ou informantes para chegar a Cunha, através de trilhas secundárias, margeando o Jacuí, surpreender as tropas paulistas, acantonadas em locais estratégicos na estrada principal, dominar Cunha e atingir o Vale do Paraíba.

         Receosos de serem obrigados a ensinar-lhe esses caminhos secundários e assim contribuir para a derrota dos Paulistas, todos os homens fugiam para bairros distantes, em zona sob o domínio dos paulistas, ou mesmo para os sertões de difícil acesso, enquanto as mulheres ficavam quase todas juntas, à mercê da situação, quando não seguiam para casas de parentes e amigos, fora do raio da região em conflito.

         À noite os soldados vasculhavam as casas à procura dos homens que poderiam informar as trilhas ou as posições das tropas paulistas nas redondezas; ciente disso, eles dormiam no mato.

         Para ira dos ditatoriais, nenhum dos homens que conseguiram agarrar sabia ou dizia não saber desses caminhos marginais. Restavam dois ou três que ainda estavam escondidos numa região longínqua supostamente ao lado de algum reduto paulista. Dentre eles estava Paulo Virgínio. E para pegá-los, o comandante das tropas, já avisado por alguém onde estavam, simulou uma requisição, mandando alguém avisá-los para comparecer ao acampamento para fazer requisição do que fora perdido e que depois da revolução tudo seria restituído ou pago.

         E assim, Paulo Virgínio, e mais um ou dois amigos vieram atender o comunicado, porque dele mesmo havia sido pego pelos “cariocas” um animal e outras coisas. Assim que surgiram, um de seus companheiros presos disse ao comandante que aquele lá ( apontando para Paulo Virgínio ), passava onde estavam as tropas paulistas. Dois ou mais soldados após esse fato, ficaram de tocaia; e, quando chegaram na estrada, foram presos e Paulo Virgínio amarrado com as mãos às costas.

         A partir do momento de sua prisão ( 4 horas da tarde, aproximadamente, no dia 27 de julho de 1932 ), Paulo Virgínio passa a receber insultos e ser agredido pelos soldados ditatoriais, porém a tudo resistiu calado. E presos ficaram numa casa à beira da estrada, no bairro da Aparição, permanecendo Paulo Virgínio a noite toda amarrado, ora de pé, ora sentado, sem sair um só instante, enquanto seus companheiros saíram normalmente para satisfazer as necessidades fisiológicas.

         Ele não entendia porque dentre tantas pessoas – cerca de nove, muitas delas parentes e as outras amigas, somente ele, estava sendo tratado daquela maneira. Ficava calado durante a noite toda, talvez por perplexidade, pois era humilhante para ele, homem simples, pobre, porém trabalhador, não por estar preso com os demais, porque na revolução era fato comum entre os cíveis da região; porém, ser amarrado, acoitado e injuriado, era demais...

         Entretanto, não sabia que havia sido denunciado por um de seus próprios companheiros de cativeiro. Quem o fez, certamente o fez por ignorância e medo de ser morto, sem pensar na conseqüência drástica que haveria.

         No raiar do dia 28/07/32, involuntariamente, Paulo Virgínio tornou pior sua situação. Saiu, a fim de satisfazer as necessidades fisiológicas, e em seguida, tentou escapar da prisão, saindo apressadamente, mal sabendo que estava sendo vigiado. Na pressa escorregou e caiu no córrego de outro lado da estrada e foi pego pelos soldados.

         A partir dessa denúncia, iniciou-se o processo de seu suplício.

         Levaram-no à presença do comandante Tenente Airton Teixeira Ribeiro e este, prometeu-lhe liberdade, se contasse a posição das tropas. Paulo Virgínio sabia, no entanto prometeu aos soldados paulistas acantonados na região por onde passava para fugir dos “cariocas”, não dizer onde estavam e assim, tinha passagem livre entre eles. Ante a negativa de Paulo Virgínio, o dito tenente enraiveceu e entregou a vítima aos cuidados do sargento Juvenal Bezerra Monteiro, que lhe rasgou a camisa, desferindo-lhe socos e pontapés, no coRpo já fraco.

         As afirmações de que era paulista e, que São Paulo venceria, deixavam os ditatoriais ainda mais ferozes. A água que fervia numa lata grande foi-lhe jogada no corpo já bem ferido e ensangüentado. Em seguida levaram-no à bica do monjolo (existente nos arredores da casa) e derramaram-lhe a água gelada do horroroso inverno de julho sobre o corpo semidestruído. Conduziram-no logo mais, novamente, à presença do referido tenente para responder as mesmas perguntas e ele reticente, enfatizou sempre o “não” e que “São Paulo venceria”.

         Isto posto, o tenente Airton reconduziu a vítima ao algoz ( Sargento Bezerra ) para que este, desta vez, o fuzilasse.

         Deram-lhe uma enxada e levaram-no sozinho a alguma distância da casa, onde estavam presos seus companheiros, para que ele cavasse sua própria sepultura; e nem bem terminara de completar os sete palmos de profundidade, deixou cair a enxada e gritou-lhes que “São Paulo venceria” e que sua morte seria vingada. Em seguida ouviram-se, à distância, os tiros desferidos pelos sargentos Juvenal Bezerra Monteiro, Roque Eugênio de Oliveira, Ascendino Paiva e o fuzileiro naval Raimundo Jerônimo, sobre o corpo que caía inerte na sepultura, que ele próprio cavara.

         Eram, aproximadamente, seis entre sete horas da manhã de 28/07/32.

         Morreu Paulo Virgínio, permaneceram, portanto sua simplicidade, bravura e sacrifício, transformando-o em mártir e herói.

         Rendemos-lhe, portanto nossas homenagens.

MATÉRIA FORNECIDA PELO GRANDE ESTUDIDO DA REVOLUÇÃO DE 1932, SR. JOÃO VELOSO DIRETOR DO CENTRO DE CULTURA E TRADIÇÃO DE CUNHA.
 

terça-feira, 4 de junho de 2013

CAPITÃO NECO, UM HERÓI DA REVOLUÇÃO EM CRUZEIRO!

 O Capitão Manoel de Freitas Novaes Neto, Capitão Neco,  nasceu na cidade de Cruzeiro, a 15 de Novembro de 1892. De tradicional família cruzeirense, era filho do Coronel Francisco de Paula Novaes e de Dona Anna Romeu e neto do Major Novaes, fundador da cidade. Passou sua infância e adolescência na Fazenda Boa Vista em Cruzeiro. Formou-se pela escola militar em 1915, tendo servido nas guarnições de Lorena, Barbacena, Realengo, Piquete, Curitiba, Caçapava e outras. Engenheiro militar com curso de aperfeiçoamento de Oficiais e de química aplicada a guerra, e ao eclodir a Revolução Constitucionalista, era o Comandante da 2ª Cia do 5º BI de Lorena. Assumiu o controle da Frente Norte da Revolução, que ia do Túnel da mantiqueira até Vila Queimada. Valente, destemido e profundamente admirado pela sua dedicação à causa que abraçara, conseguiu, certa vez, comandando pouco mais de cem homens, fez recuar as forças federais que seguiam para Cruzeiro com número bem superior de soldados. Entretanto, a cinco de Agosto de 1932, tendo os soldados paulistas embarcado para Queluz, travou-se acirrado combate que ocasionou o recuo das tropas federais. Satisfeito, e prevendo futuros ataques, decidiu então Capitão Neco, fazer um reconhecimento da região, acompanhado de pequena patrulha. Adiantando-se de seus soldados, o mesmo foi surpreendido por uma ordem que dizia: " Renda-se paulista ", ao que respondeu: "Um paulista morre mas não se rende ". Atingido pelo tiroteio, tombou o homem que, para seus soldados, era um exemplo de bondade e coragem. Em Cruzeiro, a notícia consternou a todos. Horas mais tarde morria ele na Santa Casa. O triste acontecimento foi amplamente divulgado pelos jornais da capital. O "Diário Popular" declarou: " O movimento constitucionalista acaba de perder, com a morte do Capitão Manoel de Freitas Novaes, um dos seus mais ardorosos defensores e um dos mais vigorosos esteios da vitória(… ) Inteligente e perspicaz, herdeiro legítimo das tradições de uma família bandeirante, paulista de velha têmpera, empregava o melhor de suas energias para que a pátria se visse logo liberta dos terríveis grilhões da ditadura e da tirania(… )" Capitão Neco foi sepultado no cemitério particular da Fazenda Boa Vista e, a 5 de Julho de 1962, teve seus restos mortais transladados para o Mausoléu 32, no obelisco do Parque Ibirapuera, onde se lê." Viveram pouco para morrer bem. Morreram jovens para viver sempre".Por sua coragem e determinação, foi homenageado com um logradouro no bairro de Santana, Zona norte da Capital Paulista. E assim foi criada a Rua Capitão Manuel Novaes.

Revolução de 32, 81 anos de história

São Paulo e Campinas sofrendo bombardeios aéreos; o porto de Santos bloqueado por navios de guerra; cidades dos vales do Paraíba e do Ribeira sofrendo ataques de artilharia e trincheiras repletas de soldados cavadas nas divisas do Estado. Tudo isso, hoje algo impensável, aconteceu faz 80 anos.

A Revolução de 32 não é um mero registro histórico. Foi algo que afetou milhões de pessoas e ainda assombra imaginações e o imaginário.
Na capital, os monumentos e os nomes de ruas e avenidas deixam isso claro. Na região próxima ao parque do Ibirapuera ficam tanto o Monumento às Bandeiras, do escultor Victor Brecheret, como o Obelisco Mausoléu aos Heróis de 32, de Galileo Ugo Emendabili. E aos locais se chega pela avenida 23 de maio, uma das datas importantes do movimento.
Ironicamente, a Fundação Getúlio Vargas fica próxima à avenida batizada com a data do início do levante, a 9 de Julho. Mas São Paulo continua sendo resistente a usar o nome do ditador. Não há o equivalente à importante avenida Presidente Vargas, do Rio, por exemplo.
Vargas foi quem provocou a coisa, afinal, com a derrubada do presidente Washington Luís, em outubro de 1930. Ele até foi bem recebido no Estado a caminho da capital, então o Rio de Janeiro. Mas logo começou a bater de frente com os políticos paulistas, saudosos do poder que tinham na República Velha.
Por exemplo, Vargas nomeou como "interventor" (no lugar do governador) o tenentista pernambucano João Alberto Lins de Barros.
Só em março de 1932 Vargas nomeou um interventor mais ao gosto dos paulistas, um civil e nativo do Estado, o diplomata aposentado Pedro de Toledo. Mas ao mesmo tempo o ditador quis mandar no comando da Força Pública (como era chamada a hoje Polícia Militar).
A Força Pública era um trunfo particularmente importante, pois constituía um verdadeiro exército em menor escala, dotada de armas como metralhadoras.
Os políticos e os militares envolvidos na conspiração contra Vargas foram ineptos. Deflagraram o movimento antes da hora, sem articular ações eficazes com potenciais revoltosos em outros estados, especialmente Minas Gerais e Rio Grande do Sul. São Paulo, com pequeno apoio de Mato Grosso, ficou isolado.
A melhor estratégia seria concentrar forças no Vale do Paraíba e rumar ao centro do poder, o Rio. Em vez de fazer isso, os líderes paulistas preferiram ficar na defesa.
Já a estratégia do ditador foi correta. Isolou São Paulo por terra e por mar, e diplomaticamente.
As principais frentes de combate estavam todas vinculadas a ferrovias e rodovias. É por isso que os famosos trens blindados foram tão importantes no conflito.
Os dois lados tiveram centenas de mortos. Não houve batalhas espetaculares; era mais razoável fugir ou se render do que lutar até a morte em uma guerra "entre irmãos". Uma batalha podia ter dez mortos, 30 feridos e 400 prisioneiros.
Vargas venceu em 32, mas houve a Constituinte em 34 (que ele já tinha prometido antes da revolta). Os líderes paulistas foram exilados, mas por pouco tempo. Vargas deu um golpe de Estado em 1937, mas o legado de 32 permaneceu e foi importante no debate ideológico subsequente e que vem até hoje.
ESTUDOS
Em 80 anos, muita tinta foi usada para descrever a Revolução de 1932. É possível identificar pelo menos três fases.
Houve uma primeira onda de textos, principalmente de origem paulista (e incluindo livros de memórias), exaltando os ideais democráticos do levante; e em seguida uma leva posterior, de origem marxista, ressaltando a ideia de que tudo não passou de uma briga entre grupos da "classe dominante", e sempre que foi necessário os "proletários" foram perseguidos.
Novos pesquisadores tentam entender o caráter multifacetado do evento, identificando uma participação popular inédita na história.

O historiador Marco Antonio Villa deixa claro que a "questão democrática" foi "a grande herança política da revolução, uma espécie de tesouro perdido, muito valioso, especialmente em um país marcado por uma tradição conservadora, elitista e antidemocrática".